Em instituições como Santander e Itaú, cliente pode escolher como será tratado
Dignidade. Barbara Aires segura o cartão de crédito com seu nome social:
“O comércio passa a me dar credibilidade” - ReproduçãoPUBLICIDADE
RIO - Atentos à demanda de clientes, alguns bancos e administradoras de
cartão de crédito já passam a permitir o uso do nome social em seus
cartões, sem exigir que o nome de batismo tenha sido alterado em
cartório. Para o movimento LGBT (Lésbicas, Bissexuais, Travestis,
Transexuais e Transgêneros), a prática é uma vitória na luta pela
aceitação da diversidade.
O uso do nome social por travestis e transexuais é permitido na
administração pública federal desde abril deste ano, quando foi assinado
decreto pela então presidente Dilma Rousseff com este fim. O decreto
não faz menção a formas de tratamento desse grupo social em instituições
privadas. Ainda assim, Itaú Unibanco, Santander e a administradora de
cartões NuBank resolveram aderir à prática. Entre bancos públicos, o
Banco do Brasil também adota o procedimento.
Cris Junqueira, cofundadora do NuBank, conta que a política de respeito
ao nome social surgiu na empresa a partir da demanda de clientes. Ela
explica que a decisão se baseia no conceito de tratar o cliente da
maneira como ele gostaria de ser tratado, com respeito à diferença.
— Os clientes começaram a solicitar e pensamos: por que não? — indaga Cris.
A empresária diz ainda que, como a checagem de documentação é feita com
base no CPF e no nome da mãe — que não mudam com o uso do nome social —,
as exigências burocráticas são as mesmas das feitas para clientes que
usam o nome de registro civil: é necessário tirar uma selfie com o
documento de identidade, dentro do próprio aplicativo do NuBank, e
aguardar a liberação do cadastro.
RESPEITO À DIFERENÇA
No Santander, a prática também vem sendo adotada e não se limita à
comunidade LGBT. De acordo com Rodrigo Cury, superintendente executivo
de cartões do banco, basta o cliente abrir uma solicitação junto à
instituição, declarando que quer usar um nome diferente daquele de
registro. A solicitação pode ser feita diretamente com o gerente ou por
meio da central telefônica.
— Acreditamos que essas práticas têm cada dia mais espaço no mercado,
ajuda a cativar o cliente. No mundo dos cartões, o nome de registro não
autoriza a transação e, sim, aquele que está gravado no cartão — afirma
Cury.
Mulheres trans, como a atriz Barbara Aires já conseguem obter um cartão
com o nome que escolheram adotar. Ela solicitou o uso de seu nome social
na aquisição de um cartão do NuBank. Ela já tinha se acostumado a não
usar cartão de crédito porque, antes do modelo de chip — que não exige
apresentação do documento de identidade —, passou por transtornos ao
apresentar dois documentos. Quando soube da novidade no NuBank, resolveu
experimentar:
— Só tive que enviar a foto e responder a um e-mail. A satisfação
pessoal de usar o nome social é muito grande, o comércio passa a me dar
credibilidade.
A administradora Laura Zanotti, moradora de Belo Horizonte, tem, há
cerca de quatro anos, o cartão do Banco do Brasil com o nome que adotou.
Segundo o BB, para pedir o direito ao nome social, basta o cliente
manifestar essa preferência na sua agência.
— É um alívio circular com um documento que não vai fazer com que me
questionem. Sinto-me impulsionada a comprar mais, saio mais de casa,
convivo mais socialmente. O cartão com o nome social ajuda, inclusive,
no processo de retificação de registro, é uma prova de que eu já utilizo
aquele nome — diz Laura, que entrou com o processo judicial de
retificação do nome há pouco mais de um mês.
‘“Quando um banco permite a troca (de nome), é uma vitória para esse
público”’- RAQUEL CASTROPresidente da Comissão de Direito Homoafetivo da
Ordem dos Advogados do BrasilQuem também conseguiu o direito ao nome
social foi a militar e presidente do Conselho LGBT de Niterói, Bruna
Benevides, correntista do Banco do Brasil. Na Caixa Econômica Federal,
no entanto, Bruna não conseguiu fazer a troca ao buscar informações
sobre um financiamento para casa própria na instituição.
— A gerente disse que não tinha informação sobre essa possibilidade —
conta Bruna, acrescentando que já passou por constrangimentos como
perguntarem se o cartão do banco era de um parente.
Apesar do decreto federal assinado por Dilma, a Caixa confirma que não
permite a adoção de nome diferente do que consta do documento de
identidade. Em nota, diz que a instituição só permite troca “nas
situações em que esta condição já houver sido alterada no registro civil
e, por consequência, conformada junto à Receita Federal.” O banco alega
ainda que segue resolução do Banco Central, que “proíbe a abertura de
contas com nome abreviado ou alterado.”
Para Raquel Castro, presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a impressão do nome social em
documentos é uma maneira de conferir dignidade a travestis, transexuais e
transgêneros:
— Por falta de dinheiro ou por fila de espera na Defensoria Pública,
algumas pessoas têm nome social diferente do de registro. E isso causa
constrangimentos. Quando um banco permite a troca, é uma vitória para
esse público.
O Itaú Unibanco diz que “respeita e valoriza a diversidade”. Sempre que
solicitada pelo cliente, explica o banco, a instituição analisa e efetua
a alteração dos dados cadastrais (nome e gênero) mediante apresentação
de documentos. O Bradesco não respondeu ao contato do GLOBO.
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