sábado, 21 de dezembro de 2013

Os gays são mais ricos? Autores de ‘Freakonomics’ têm dúvidas

A pergunta, enviada por um ouvinte, era simples: “por que os gays são tão ricos e bem-sucedidos?”. Afinal, bairros com grande população gay costumam ser mais bem cuidados e os gays, mais bem vestidos. Com a maneira inovadora de atacar esse tipo de questão que tornou o jornalista Stephen Dubner e o economista Steven Levitt famosos em seu livro Freakonomics, os autores destrincharam essa pergunta e suas premissas em seu podcast, e chegaram a uma conclusão: pouco se sabe de verdade sobre o poder aquisitivo dos gays, mas o pouco que se sabe conta uma história bem diferente.
As razões por que se assume que os gays são tão endinheirados já são bem conhecidas:
  • De acordo com informações do censo dos Estados Unidos, a renda familiar média de casais heterossexuais é de 86 mil dólares por ano, enquanto a de casais gays é de 105,6 mil dólares por ano (No Brasil, a proporção de casais gays na faixa de maior poder aquisitivo também é maior que a proporção de casais héteros, segundo o último senso do IBGE).
  • Os gays tendem a ter um grau de formação maior que os héteros, até como uma maneira de proteger seu futuro contra os possíveis preconceitos de que poderão ser vítimas (segundo a Unesco, cada ano extra de educação aumenta os rendimentos do indivíduo em 10%).
  • Homens (injustamente) costumam ganhar mais que mulheres, então um lar com dois homens teria automaticamente maior rendimento.
  • E por fim, há a famosa sigla DINK – Dual Income, No Kids, ou seja, renda dupla sem crianças. Como os gays não costumam ter filhos para sustentar, eles podem dispor desse dinheiro em seu próprio conforto.
Acontece que essas informações não necessariamente refletem a realidade. Pesquisas que tentam desvendar a vida dos homossexuais sempre batem num grande obstáculo: o objeto pesquisado mente. Pesquisas de censo, tanto nos EUA como no Brasil, dependem da autodeclaração dos casais – ou seja, Pedro e João têm que fazer questão de contar pra mocinha do senso que são um casal sim. Caso contrário, suas escovas de dentes no mesmo copo, seu lar com três cachorros e seu relacionamento de décadas continuarão desconhecidos pelo IBGE. Outra distorção que pode ser causada por esse tipo de pesquisa é que casais gays mais bem sucedidos tendem a querer divulgar mais seu sucesso, o que pode fazer que uma proporção maior de gays ricos exibam-se para as estatísticas.
Outra falha do sistema é exatamente essa preocupação sobre a vida de casais. Existe muito pouca informação sobre a vida e a renda dos gays solteiros – para os censos, solteiros são todos igualmente solteiros, independente da atração sexual. As bichas descompromissadas podem não estar tão bem na conta bancária assim.
As poucas pesquisas confiáveis sobre o tema, realizadas pelo Instituto Williams da Universidade da Califórnia em Los Angeles, apontam um quadro bem diferente: homens gays e bissexuais em média ganham 10 a 32% menos que homens heterossexuais com as mesmas qualificações (mulheres lésbicas na verdade ganham mais que as mulheres heterossexuais, provavelmente porque podem se dedicar à carreira e à formação de uma maneira que mulheres heterossexuais com filhos não conseguem). Os pesquisadores suspeitam que há duas razões para isso:
  • Discriminação pura e simples: os empregadores percebem nos currículos a orientação sexual dos candidatos e passam outros, de heterossexuais, na frente. De fato, não é tão difícil assim descobrir se alguém é gay pelo currículo. Se ele for solteiro em idade “avançada”, já é um indício. As experiência profissionais anteriores podem também dar pistas. E, na falta disso tudo, uma varredura nas redes sociais também funciona. Andras Tilcsik, sociólogo de Harvard, chegou à conclusão de que currículos que deixam explícito que o candidato é gay têm 40% menos chance de conseguir uma entrevista de emprego que os de héteros. Uma entrevista. Imagina o emprego em si.
  • Tipo de emprego: homens gays também muitas vezes têm tipos de trabalho que são historicamente pior remunerados: enfermeiros, cabeleireiros, professores etc.
A conclusão a que chegam Levitt e Dubner: esse é mais um caso em que ideias preconcebidas distorcem a visão da realidade, como acontece tantas vezes, especialmente com os homossexuais. A história dos gays se espalha talvez por necessidade de se validar um nicho econômico, talvez numa tentativa de atrair mais respeito para uma fatia da sociedade historicamente desprezada, talvez por inveja dos heterossexuais que se revoltam ao ver gays farreando em cruzeiros enquanto eles têm que ralar para pagar a escola das crianças. Mas a realidade é outra.

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